27 agosto 2023

CONTEXTO: MODERNISMO & SEMANA DE ARTE MODERNA

12 DE DEZEMBRO DE 1917

SÃO PAULO, BRASIL.

 

A jovem pintora brasileira Anita Malfatti, de apenas 28 anos, abriu as portas de um salão de arte em São Paulo, para apresentar 53 novos quadros, entre paisagens, figuras e gravuras. As obras apresentavam técnicas plásticas modernas, as quais a artista conhecera na Independent School of Art, em Nova York, e na academia Lewin-Funcke, na Alemanha. Em um período em que a maioria dos artistas brasileiros iam à Itália ou à França estudar, a influência estadunidense e alemã fazia com que quadros como O homem amarelo e A estudante russa denunciassem procedimentos de intensidade inédita, como a separação difusa das figuras retratadas e da paisagem, a pincelada livre e não tão planejada, a liberdade para compor as cores, as luzes.

Como frequentemente acontece com o que é novo, as telas de Anita dividiram a opinião pública. O jovem escritor Mário de Andrade identificou nas obras a chegada de algo novo ao Brasil. “Não posso falar pelos meus companheiros de então, mas eu, pessoalmente, devo a revelação do novo e a convicção da revolta a ela e à força de seus quadros”, escreveu fisgado pelo movimento modernista graças aos quadros da artista brasileira. A admiração positiva e surpresa também invadiu o pintor Di Cavalcanti e o poeta Mário da Silva Brito.

            O trabalho, porém, não agradou o escritor Monteiro Lobato, que resolveu escrever um artigo classificando-o como “arte anormal” e, embora reconhecendo o talento genuíno de Malfatti, acusando-a de ver “anormalmente” o mundo à sua volta. 

Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que veem as coisas e em consequência fazem arte pura, guardados os eternos ritmos da vida, e adotados, para a concretização das emoções estéticas, os processos clássicos dos grandes mestres. [...] A outra espécie é formada dos que veem anormalmente a natureza e a interpretam à luz das teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. [...] Estrelas cadentes, brilham um instante, as mais das vezes com a luz do escândalo, e somem-se logo nas trevas do esquecimento. 

A crítica caiu como uma bomba no círculo artístico. Os admiradores do trabalho de Malfatti, sobretudo os que viam nele a renovação da arte brasileira, saíram em sua defesa na imprensa, como Mário e Oswald de Andrade. Não adiantou muito. O estrago já estava feito. O julgamento de um formador de opinião tão respeitado como Lobato fez com que algumas das telas vendidas na exposição fossem devolvidas e mecenas mais tradicionais olhassem para a pintora com olhares tortos. Tao jovem, com apenas 28 anos, e com poucas oportunidades de expor e explorar seu potencial criativo, Anita Malfatti parecia viver o fim de sua carreira.

            Mas este episódio resultou em algo positivo, pois o pioneirismo de Anita instigou artistas a se juntarem para renovar a arte brasileira, romper com a tradição e criar algo genuinamente nacional: pintores, escritores, músicos, escultores e arquitetos sintonizados com a modernidade, as novas tecnologias e os movimentos de vanguarda, dispostos a criar uma arte que não fosse apenas cópia do que vinha da Europa, mas que transpirasse brasilidade. Havia sido plantada a semente do modernismo brasileiro, que floresceria cinco anos mais tarde, na Semana de Arte de 1922.

            A Semana de Arte Moderna, não durou uma semana, mas apenas três dias (13, 15 e 17 de fevereiro). Foi planejada por artistas que queriam romper com a tradição e renovar as expressões culturais brasileiras. O ano não foi escolhido ao acaso, afinal, 1922 marcava a comemoração dos cem anos da Independência do Brasil. Se em 1822 0 Brasil conquistara a independência política de Portugal, cem anos depois os modernistas reivindicavam a nossa independência cultural.

            A programação foi bem organizada e os eventos, sediados no Theatro Municipal de São Paulo. Cada dia foi reservado a uma expressão artística. Na segunda noite, 15 de fevereiro, foi a vez da literatura, o que fez os ânimos do público fervilharem. Menotti del Picchia abriu a cerimónia com uma palestra sobre as letras modernas, ilustrada com poemas de Oswald e Mário de Andrade. Durante o intervalo, Mário recitou poemas no saguão do Municipal. Depois de o público já ter ouvido diferentes provocações, Ronald de Carvalho subiu ao palco para ler o poema Os sapos, de Manuel Bandeira, que estava adoentado e não pôde comparecer. Os versos – uma grande provocação aos poetas parnasianos, que davam mais valor à forma do que ao conteúdo – não tinham métrica, anunciavam o manifesto da poesia moderna, estilo com o qual o público não estava acostumado. Era um tapa na cara da tradição literária e a reação foi imediata. A plateia se levantou e, na mesma hora, se dividiu entre vaias e aplausos. Há quem defenda que as vaias foram uma grande estratégia para os organizadores chamarem a atenção: Oswald de Andrade teria pedido a estudantes que começassem a tumultuar durante a leitura para contaminar os outros presentes e incentivá-los a se manifestar. Oswald queria que o evento chamasse a atenção da sociedade. Combinados ou espontâneos, os aplausos e as vaias colocaram o evento sob os holofotes.

            Planejado e realizado para ser um rompimento com a tradição artística, o evento apresentou uma série de incoerências. A primeira delas foram justamente os investidores: empresários e fazendeiros paulistas que consumiam a arte tradicional. Sim, os mecenas que abriram a carteira e estiveram na plateia dos recitais, óperas e exposições eram os mesmos oligarcas que investiam em artistas que reproduziam a cultura europeia. Mas eles tinham um interesse bem definido. Um evento como esse colocava a arte produzida em São Paulo sob os holofotes. Em um momento em que o Rio de Janeiro, então capital federal, era o grande polo cultural do Brasil e os artistas cariocas as nossas grandes estrelas, a Semana de 22 era a oportunidade de começar a mudar esse cenário e fazer com que os brasileiros olhassem para o que era criado na capital paulista.

            Da parte dos organizadores, daria para não se render a esses grandes investidores? A resposta desemboca na segunda contradição: talvez sim, se a estrutura da Semana não fosse idêntica à dos eventos tradicionais. O que não aconteceu. A Semana de 22 foi realizada no Theatro Municipal de São PauIo, principal espaço paulista dedicado à apresentação do convencional. Por que anunciar a renovação justamente no palco onde a arte convencional sempre foi exposta? Talvez para causar mais barulho, para chocar mais, para ser vista por mais olhares influentes. O fato é que não sair da caixa (ou melhor, do teatro) fez com que boa parte da plateia do evento fosse justamente a tradicional. 

Ao contrário do que aparece hoje em livros de literatura, a Semana de 22 não foi um marco na época em que foi realizada. Foi mais um evento do Theatro Municipal de São PauIo, aliás, um evento não muito bem recebido pelo público e pela crítica especializada.

            O reconhecimento só veio com o tempo. Com o passar das décadas, a liberdade defendida por aqueles jovens que pareciam loucos e a busca por uma arte que refletisse uma estética brasileira começaram a ser respeitadas e valorizadas. O que pareceu sem importância à primeira vista foi provando-se, a longo prazo, um divisor na trajetória da literatura brasileira.

            A Semana de 22 foi como a queda de uma pedra em um lago: num primeiro momento, rompe a barreira da água e causa uma ondulação pontual; mas, com o passar do tempo, essa ondulação se espalha e movimenta todo o lago à sua volta.

 

O homem amarelo e A estudante russa, de Anita Malfatti
 

[TRECHO DO POEMA Os Sapos]
 
Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
 
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
– “Meu pai foi à guerra!”
– “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”.
 
O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: – “Meu cancioneiro
É bem martelado.
 
Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.

 

ADAPTADO DE: VERRUMO, M. História Bizarra da Literatura Brasileira. São Paulo : Planeta, 2017.

CONTEXTO: TOMÁS ANTÔNIO GONZAGA

Era uma vez uma menina de 15 anos, virgem e criada em Vila Rica, no interior de Minas Gerais. Certo dia, um amigo de seu tio, um português de quase 40 anos, se encantou com sua beleza e seu jeito. Em pouco tempo, o quarentão começou a namorar a jovem e, em sua homenagem, a escrever poemas, declarando seu amor e a reverenciando. O namoro durou seis anos, até que o poeta a pediu em casamento.

            Faltando uma semana para a cerimônia, o destino virou contra os enamorados. A Rainha ordenou a prisão do noivo, alegando que ele estava envolvido em uma conspiração contra o Reino. À jovem coube a solidão da espera pela sentença; ao acusado, restou colocar no papel a dor que sentia por estar longe de sua amada enquanto seu destino era selado.

            É a história de amor entre o escritor Tomás António Gonzaga e Maria Doroteia Joaquina de Seixas. As declarações em forma de poema dariam origem a um dos livros mais aclamados do arcadismo brasileiro, Marília de Dirceu.

            Gonzaga – eternizado no eu-lírico Dirceu – conheceu Maria Doroteia – a Marília dos poemas – em 1783, em uma festa na casa de um tio da moça, um advogado da elite de Vila Rica, atual Ouro Preto. O literato tinha se mudado havia pouco de Portugal para o Brasil, após terminar um curso de Leis, e na festa do amigo se apaixonou pela jovem. Escrever os poemas foi a forma que encontrou de declarar seu amor a ela:

            Os teus olhos espalham luz divina,

            A quem a luz do Sol em vão se atreve:

            Papoula, ou rosa delicada, e fina,

            Te cobre as faces, que são cor de neve.

            Os teus cabelos são uns fios d’Ouro;

Teu lindo corpo bálsamos vapora.

            Ah! Não, não fez o Céu, gentil Pastora,

            Para glória de Amor igual tesouro. 

            Eram tempos difíceis na Colônia, época em que manifestações explodiam em várias províncias, clamando pela Independência do Brasil, e a Coroa portuguesa investia em uma caça aos insurgentes. O poeta, que também era autor das Cartas chilenas, textos em que satirizava o governo colonial, acabou sendo um dos presos e investigados sob a acusação de envolvimento com a Inconfidência Mineira. Dos braços de Maria Doroteia, Tomás foi tirado e jogado em uma prisão no Rio de Janeiro. O amor, então, ressurgiu da pena do poeta, e o eu-lírico Dirceu outra vez se declarou à amada:

Nesta cruel masmorra tenebrosa

Ainda vendo estou teus olhos belos,

A testa formosa,

Os dentes nevados,

Os negros cabelos.  

Depois de três anos preso, em 1792 Tomás António Gonzaga ouviu sua sentença: seria exilado em Moçambique por uma década. Talvez ele ainda não soubesse, mas aquela era também a sentença do fim do seu relacionamento com Maria Doroteia. 

Se na vida do casal esse ano marca o ponto final da união, na literatura registra o início da popularização do amor de Dirceu por Marília. Nesse período, os poemas escritos antes de o escritor ser preso foram publicados pela primeira vez em Lisboa. A obra se tornou um sucesso tão grande de público que, em menos de duas décadas, seria reeditada sete vezes. Em território brasileiro, a primeira edição seria lançada em 1810, dois anos após a família real se mudar para o Brasil e a Imprensa Régia ser criada.

            Na arte, à medida que o romantismo do poeta se espalhava, criava-se um mito ao redor dos cônjuges. Na vida do casal, cada um seguia seu próprio caminho. E Gonzaga seguiu rapidamente. Um ano após ser enviado para o país africano, casou-se com outra mulher, com quem teve dois filhos. Em Moçambique, viveu até o resto dos seus dias, em 1810.

            Por aqui, Maria Doroteia parece não ter tido a mesma felicidade para construir uma nova família. Sozinha, continuou em Vila Rica, dedicando-se a tarefas domésticas, leitura de livros, bordados e ir à missa. A historiadora Ana Jardim, comparou o esquecimento e a solidão da musa inspiradora ao esquecimento e à solidão da própria cidade mineira em que ela vivia: “O abandono e o envelhecimento de Maria Doroteia repetem na mulher a sina de uma Vila Rica já quase abandonada. Foram as duas escasseando do ouro, da beleza, do tempo, da juventude, e se preservando do assédio dos olhares externos”. Maria Doroteia morreu em 1853.

            Quase um século após a morte da mineira, o último capítulo do amor de Marília e Dirceu seria escrito. Em meados da década de 1930, o presidente Getúlio Vargas ordenou a repatriação dos restos mortais dos inconfidentes. O corpo de Tomás António Gonzaga foi trazido de volta ao Brasil e levado ao Museu da Inconfidência, em Ouro Preto. Em 1955, uma década depois, o de Doroteia foi retirado do cemitério onde fora sepultado e colocado ao lado dos restos de Gonzaga. Mesmo que postumamente, o mais famoso casal da literatura árcade brasileira pôde, finalmente, ficar junto outra vez.

 


 

ADAPTADO DE: VERRUMO, M. História Bizarra da Literatura Brasileira. São Paulo : Planeta, 2017.

CONTEXTO: GRACILIANO RAMOS

A cidade alagoana de Palmeira dos Índios vivia uma situação dramática em 1927. No ano anterior, o prefeito havia se desentendido com um fiscal de tributos e, no meio do bate-boca, viu seu oponente sacar um revólver e disparar em sua direção. Num ambiente de “aqui se faz, aqui se paga”, um delegado da polícia chegou, pegou uma arma e puxou o gatilho. O fiscal pagou com a própria vida por ter atirado contra a autoridade maior da cidade. Aterrorizados, os moradores assistiam em praça pública à morte do prefeito que haviam elegido e à de seu algoz. Passada a tragédia, quem assumiu a prefeitura foi o vice-prefeito, que teve de permanecer à frente da cidade por pouco mais de um ano, até serem concluídas as eleições de 1927.

            Em plena República Velha, o processo eleitoral da pequena cidade no interior do Alagoas era bem diferente do atual e ditado pelos interesses de grandes fazendeiros. À população, cabia aceitar decisões e ofertas dos poderosos e fechar os olhos para os trâmites ocultos. Em 1927, a decisão dos poderosos foi apoiar a eleição de um homem que, mais tarde, se tornaria um grande literato.

O indivíduo “escolhido” pelos fazendeiros tinha um nome benquisto pelos locais e havia tido êxito como presidente da Junta Escolar na gestão do prefeito anterior. Quando ainda ocupava o cargo, um dia chegou sem avisar a uma escola e encontrou professoras sentadas em roda nos corredores, sem estudantes para ensinar em pleno período letivo. Impressionado, questionou o que estava acontecendo e descobriu que o regulamento do colégio não permitia que os alunos fossem estudar sem uniforme e sem calçados. Por se tratar de uma região muito pobre, as crianças não tinham o que vestir e acabavam ficando em casa. Chocado com a situação, o então presidente da Junta Escolar mandou comprar sapatos e uniformes para todos. Deu certo, e não tardou para que a escola se enchesse outra vez. Seu nome era Graciliano Ramos de Oliveira.

            Sabe-se que, como prefeito, foi um homem de pulso firme: mergulhou no estudo das gestões anteriores, nas políticas públicas da cidade, cortou gastos, demitiu funcionários ociosos. Chegou a se desentender com fazendeiros e empresários que foram prejudicados com as reestruturações.

Em agosto de 1928, Graciliano criou o Código de Postura Moral, uma cartilha com 82 artigos em que proibiu uma série de práticas comuns aos moradores da cidade, como comprar remédio sem receita, dormir e mendigar na rua e criar animais em áreas públicas. Eram medidas sanitaristas que, por irem contra hábitos muito antigos dos habitantes, desagradaram boa parte da população inclusive Sebastião Ramos, o pai do prefeito. Sebastião criava porcos e cabritos em terrenos baldios e foi multado pelo próprio filho, que foi enfático em sua decisão: “Prefeito não tem pai. Eu posso pagar a sua multa. Mas terei de apreender seus animais toda vez que o senhor os deixar na rua”.

            Por evitar favoritismo e não sucumbir aos jogos de interesses tão comuns da época, não tardou para Graciliano se frustrar com a máquina pública e uma estrutura tão cristalizada e complexa de ser modificada. Mas o prefeito resistiu, manteve a postura firme e continuou fazendo o que acreditava ser correto.

            Seguiu o estilo determinado até na redação de relatórios, documentos que chamam a atenção pela riqueza literária. Enquanto a maioria dos relatórios de gestores públicos são repletos de termos burocráticos, números e palavras difíceis, os escritos da administração de Graciliano Ramos contavam histórias, construíam contextos, criavam enredos do que se passava na cidade. Não eram chatos, mas envolventes. Como político, ele já mostrava sinais de sua veia literária.

            Os textos chamavam a atenção. Jornalistas, impressionados com as descrições, passaram a publicar os relatórios, e as linhas a ganhar admiradores dentro e fora da cidade alagoana. Em 1930, exausto com o clientelismo, prejudicado com o baixo salário público, vendo seus negócios minguarem com a Crise de 1929 e sua família enfrentar uma situação financeira delicada, Graciliano Ramos renunciou ao cargo de prefeito. Precisava colocar dinheiro dentro da própria casa. O vice concluiu o mandato de Graciliano, que encerrava sua carreira política.

            Contudo, tinha início sua carreira literária. Um de seus relatórios caiu nas mãos de um editor, que, impressionado com o talento do ex-gestor público, o contatou. Em 1933, seria publicado o primeiro romance de Graciliano Ramos, Caetés, e o alagoano deixaria de vez o título de ex-prefeito para ocupar o cargo de “escritor”.

 

 




 

VERRUMO, M. História Bizarra da Literatura Brasileira. São Paulo : Planeta, 2017.

CONTEXTO: ALUÍSIO DE AZEVEDO E "O CORTIÇO"

O Rio de Janeiro, capital federal na virada do século XX, não foi apenas uma cidade que abriu as portas para a Europa e recebeu novos costumes e tecnologias inovadoras. Foi também um espaço marcado pela desigualdade socioeconômica. 

            Um dos romances que escancara a miséria carioca da época é o livro naturalista O cortiço, de Aluísio Azevedo. Publicado em 1890, a obra é um retrato de um ambiente habitado por seres descritos quase como animais, os quais, ao longo da narrativa, têm seus comportamentos avaliados pelo escritor a partir de teorias científicas do período, como o darwinismo social.¹

Nesse caso, a ficção se inspirou na realidade. Havia muitas habitações de imigrantes, escravos recém-libertos, pequenos comerciantes, gente que não nasceu endinheirada e sobrevivia sem um tostão no bolso. Chamadas de “classes perigosas’ pelos mais ricos, esses indivíduos tinham ao seu dispor poucos metros quadrados e quase nenhuma infraestrutura para viver com dignidade. Sem banheiro, torneira e o mínimo adequado para viver, moravam em locais nos quais corriam o risco de se contaminar com doenças tropicais, e não eram poucos os adoentados.

As doenças, a pobreza e o medo que os ricos tinham da violência desses cidadãos começaram a preocupar os agentes de segurança pública do final do século XIX. O cortiço que inspirou Aluísio Azevedo, o Cabeça de Porco, era o que mais causava temor: maior cortiço do Centro do Rio de Janeiro, chegou a abrigar 4 mil pessoas. Não demorou para ser alvo de um processo de higienização. No dia 26 de janeiro de 1893, o prefeito Cândido Barata Ribeiro, três dias após enviar uma carta ao proprietário do local com ordem de desocupação imediata das casas, mandou um grupo de policiais destruir cada uma das residências do agrupamento e não deixar nada em pé.

            De acordo com o historiador Sidney Chalhoub, a ação dos agentes públicos começou por volta das 18h, quando tropas do governo e curiosos começaram a se aglomerar na frente do número 154 da rua Barão de São Félix, endereço do Cabeça de Porco. A fachada do cortiço era simbólica: em cima de uma arcada que remetia aos arcos greco-romanos, havia uma grande estátua da cabeça de um porco, para ninguém ter dúvida do que funcionava naquele local.

            O portão de entrada dava para um corredor principal, que ficava entre duas grandes alas com centenas de casinhas. Entre um barraco e outro, às vezes surgia uma viela, que dava para os fundos do cortiço, onde mais gente morava.

            Às 19h30, a operação teria sido deflagrada: tropas invadiram o cortiço, fechando a entrada principal. Um grupo subiu corredor adentro e se posicionou no lado oposto à entrada, proibindo que os moradores saíssem pelos fundos com seus pertences. A ordem era clara: ninguém iria entrar nem sair, e tudo o que estivesse ali seria destruído.

            A demolição começou pelas casas da ala à esquerda, fechadas há um ano por ordem da Inspetoria Geral de Higiene, que considerou o local potencialmente infeccioso aos moradores. O surpreendente, foi que, enquanto os policiais destelhavam as casas onde era proibido viver, mulheres saíam com crianças no colo e arrastavam colchões. Derrubadas todas as casas à esquerda, o batalhão partiu para a ala oposta, numa cena ainda mais dramática, já que ainda havia muitos moradores ali. Entre os escombros que caíam, não foram poucos os que tentaram salvar um móvel, uma recordação familiar, um documento. Muito se perdeu. Na manhã do dia 27, o antigo Cabeça de Porco amanheceu destruído, os destroços espalhando poeira pela região central da cidade.

            A destruição do cortiço que inspirou Aluísio Azevedo foi apenas um dos primeiros episódios da campanha higienista que tomou as ruas do Rio de Janeiro na virada do século XX. Nos anos seguintes, o terror continuou. Tomou posse o prefeito Pereira Passos, que, assim como o Presidente da República Campos Sales, desejava fazer com que a capital federal se parecesse com a francesa. A dupla investiu na demolição de outros cortiços do Centro para, no lugar, construir moradias com arquitetura mais bem planejada. O que fazer com as pessoas que ficaram sem-teto parecia ser uma preocupação secundária, menos importante do que o desejo de embelezar a capital.

            Assim como os moradores do Cabeça de Porco, muitos outros miseráveis perderam o pouco que tinham. Sem moradia e proibidos de se instalarem no Centro, dirigiram-se aos morros da cidade, onde ninguém os impedia de ficar e podiam erguer suas barracas. Morriam os cortiços, nasciam as favelas. A miséria e a violência retratadas por Aluísio Azevedo em O Cortiço começavam a se transformar na miséria e na violência. Tais circunstâncias saíam do Centro para a periferia, onde seriam menos vistas pelos olhos de quem desejava respirar ares europeus em pleno Brasil.

 

 

 

 

¹ O darwinismo social é a adaptação da teoria da seleção natural, de Charles Darwin, à sociedade. Segundo essa teoria, algumas pessoas têm uma posição privilegiada por serem biologicamente superiores, terem mais inteligência e habilidades sociais.




ADAPTADO DE: VERRUMO, M. História Bizarra da Literatura Brasileira. São Paulo : Planeta, 2017. 

25 agosto 2023

AVALIAÇÃO BIMESTRAL 3 - 8º ANO 2023

QUESTÃO 01

Look at the following infographic.

 


Available at: www.statista.com/chart/27885/change-in-share-experiencing-food-insecurity-by-world-region/

 

Read the statements about it and mark True (T) or False (F). Then, choose the correct alternative according to it.

( ) People in Africa experienced more food insecurity in 2019 than in 2021 because of the Covid pandemic.

( ) Asia experienced less food insecurity in 2019 than in 2021.

( ) Latin America & the Caribbean experienced more food insecurity in 2021 than Asia because of the Covid-19 pandemic.

( ) North America and Europe experienced less food insecurity in 2021 compared to Latin America & The Caribbean.

( ) In Africa, there was an increase of 5.5% of the population affected by food insecurity in 2021 due to the Covid-19 pandemic.

a) T – T – F – F – T

b) F – F – T – T – F

c) F – F – F – T – T

d) T – F – F – T – F

e) F – T – T – T – T

 

QUESTÃO 02

Read the following text about globalization.

Globalization is the spreading of anything worldwide. However, generally it is the process of globalizing products, businesses, technologies, philosophies, etc. all through the world. It is the creation of a successful interconnected marketplace without any limitation of time zone and national boundaries.

It is very hard to decide whether the revolution of global marketplace is beneficial or harmful to the humanity. It is still a big confusion. However, it can’t be ignored that globalization has created greater opportunities to people around the world. It has greatly changed people’s status and the way of living in the society. It is hugely benefiting the developing nations by providing various developmental opportunities.

In conclusion, globalization has affected, positively and negatively, the tradition, culture, political system, economic development, lifestyle, prosperity, etc. However, these days it is hard to imagine living in a country that is not influenced by the wider world. This can be the food that we eat, the music we listen to or the clothes that we wear.

Available at: www.indiacelebrating.com/essay/globalization-essay/. Accessed on: Jul. 6th 2023.

 

Choose the correct alternative according to the text.

a) Globalization means that the world has become bigger.

b) Globalization refers only to the way people communicate.

c) Globalization brings benefits and negative effects on people’s lives.

d) Globalization doesn’t lead to the loss of local cultures and traditions.

e) It might be easier to live in a country with no influence of globalism.

 

Read the following text in order to answer questions 3 and 4.



Biodiversity hotspots are regions of the world that are home to a large number of species that are found nowhere else on earth. These areas are important because they contain a high level of biological diversity, which is critical for maintaining healthy ecosystems and supporting human well-being.

There are currently 36 recognized biodiversity hotspots around the world, which collectively cover only 2.4% of the Earth’s land surface but contain an estimated 50% of the world’s plant and animal species. Some examples of biodiversity hotspots include the Amazon rainforest in South America, the Mediterranean Basin in Europe and North Africa, and the Eastern Afromontane region in Africa.

Unfortunately, many biodiversity hotspots are also under threat due to human activities such as deforestation, overfishing, and pollution. These threats can lead to the extinction of many species and can have negative impacts on the functioning of entire ecosystems.

Therefore, it is important to protect these areas and the unique species they contain by implementing conservation measures such as habitat restoration, sustainable land use, and the creation of protected areas. By doing so, we can help preserve the incredible biological diversity of our planet for future generations to enjoy.

Available at: https://kinnu.xyz/kinnuverse/science/ecology/biodiversity/


QUESTÃO 03

According to the text,

a) biodiversity hotspots are home to only a few endangered species.

b) all recognized biodiversity hotspots are in South America.

c) deforestation is the only human activity that threats biodiversity hotspots.

d) preserving biodiversity is essential for the planet and future generations.

e) biodiversity hotspots are not currently at risk of being destroyed nowadays.

 

QUESTÃO 04

What do the underlined words refer to in the text?

a) Animal and plant species; biodiversity hotspots; human activities; the readers.

b) Biodiversity hotspots; healthy ecosystems; deforestation; people in general.

c) Biodiversity hotspots; biodiversity hotspots; deforestation, overfishing and pollution; people in general.

d) Animal and plant species; negative impacts; deforestation, overfishing and pollution; people in general.

e) Biodiversity hotspots; conservation measures; deforestation and overfishing; people in general.

 

QUESTÃO 05

Read the following text.

Noted for its fantastic shapes and colors, the Grand Canyon is one of ___ (spectacular) sights in the United States.

With its vast expanse of rugged terrain, towering rock formations, and meandering river, it is certainly ___ (impressive) any other canyon in North America.

However, when compared to other canyons around the world, such as the Fish River Canyon in Namibia or the Yarlung Tsangpo Grand Canyon in Tibet, the Grand Canyon can be considered ___ (deep) but not necessarily ___ (wide) or ___ (long).

There are volcanic rocks in some parts of the canyon, and these are ___ (young) layers of the canyon.

People have never found dinosaur bones in the Grand Canyon and for good reason. Some of the rock in the canyon walls is about a billion year’s ___ (old) dinosaurs. However, the canyon itself was not formed until after the dinosaurs probably were long gone.

 

Choose the alternative that completes the spaces correctly.

a) the most spectacular; more impressive than; the deepest; the wider; the longest; the youngest; the older than.

b) more spectacular; more impressive than; the deepest; the wider; the longest; the youngest; older than.

c) the more spectacular; most impressive than; the deepest; the widest; the longer; younger; older than.

d) spectacular; more impressive than; deeper; the widest; the longest; the youngest; the older than.

e) the most spectacular; more impressive than; the deepest; the widest; the longest; the youngest; older than.


AVALIAÇÃO BIMESTRAL 3 - 9º ANO 2023

QUESTÃO 01

Texto para a questão a seguir.

 

“Ainda há histórias para contar” no universo Breaking Bad, diz Vince Gilligan

 

Vince Gilligan, o criador de Breaking Bad e Better Call Saul, acha que esse universo ficcional ainda não se esgotou – mas deve passar pelo menos algum tempo afastado dele mesmo assim.

            Em conversa com o Deadline, o roteirista contou que está trabalhando em um projeto "totalmente diferente do que fez antes", mas não descartou voltar a Breaking Bad no futuro.

            “Ainda há histórias para contar [neste universo], mas quando digo que estou fazendo algo diferente, não é para provar algo para o mundo. É para provar algo para mim”, esclareceu ele.

            Colega de Gilligan em Better Call Saul, Peter Gould deu resposta semelhante: “Eu amo esses personagens e este mundo. Talvez um dia possamos voltar – mas, pessoalmente, quero tirar uma folga disso e tentar algo diferente”.

            Além do derivado focado no personagem de Bob Odenkirk, Breaking Bad já originou também o filme El Camino, que acompanha a jornada de Jesse Pinkman (Aaron Paul) depois da série original.

            A sexta e última temporada de Better Call Saul contará com 13 episódios divididos em duas partes: os sete primeiros começam a ser exibidos em 19 de abril, e os seis últimos em 11 de julho.

Disponível em: https://www.omelete.com.br/breaking-bad/vince-gilligan-mais-historias.

 

O texto apresenta dois objetivos claros, um presente na primeira parte da notícia e outro, ao final. As intenções textuais são

a) detalhar a saída do criador da série e explicar os motivos que o levaram a essa decisão.

b) demonstrar que a série foi renovada e que haverá mudanças no elenco.

c) chamar a atenção para o esgotamento dos criadores da série e alertar sobre o cansaço mental.

d) revelar o afastamento dos criadores da série e divulgar a última temporada.

e) cativar o público ao informar o fim da série e demonstrar apoio à saída de seus criadores.


 QUESTÃO 02

Releia o título da notícia:

“‘Ainda histórias para contar’ no universo Breaking Bad, diz Vince Gilligan”

 

Em relação ao núcleo oracional destacado no trecho anterior, pode-se afirmar que

a) o sujeito da oração é simples.

b) houve indeterminação do agente verbal.

c) existem dois núcleos na composição do sujeito.

d) no caso em questão, o sujeito é inexistente.

e) ocorreu uma elipse, ou seja, apagamento do sujeito.


QUESTÃO 03

Caso houvesse a necessidade de alterar o verbo em destaque por um correspondente, mantendo a formalidade do texto, o indicado seria:

a) existem

b) ocorrem

c) acontecem

d) tem

e) aparecem

 

QUESTÃO 04

 


A placa não está de acordo com a norma-padrão, pois

a) não deveria ser utilizado um artigo antes do substantivo.

b) o adjetivo “proibido” deveria ter sido usado no feminino.

c) o substantivo “proibido” não deveria sofrer flexão de gênero.

d) o adjetivo “proibido” pertence ao gênero neutro, e, portanto, deveria estar no feminino.

e) “proibido” é verbo e sofre flexão em número e pessoa, mas não em gênero.

 

- Leia o texto astrológico a seguir para responder às questões 5 e 6.

 


 Disponível em: www.metropoles.com/vida-e-estilo/horoscopo/horoscopo-2023-confira-a-previsao-de-hoje-07-03-para-seu-signo.

 

QUESTÃO 05

O reconhecimento dos diferentes gêneros textuais, seu contexto de uso, sua função social específica, seu objetivo comunicativo e seu formato mais comum relacionam-se aos conhecimentos construídos socioculturalmente.

A análise dos elementos constitutivos desse texto demonstra que sua função é

a) pedagogicamente ensinar os caminhos para o sucesso na vida.

b) trazer conselhos para as pessoas que pertencem ao signo em questão.

c) informar sobre as etapas de produção de um projeto de vida.

d) expor a opinião do redator acerca da vida dos arianos.

e) estabelecer uma relação harmônica entre os arianos e as etapas de suas vidas.

 

QUESTÃO 06

Os verbos que, no contexto, comportam-se como transitivos indiretos são:

a) “aprove” e “impulsione”.

b) “trará” e “invista”.

c) “invista” e “cuide”.

d) “aprove” e “cuide”.

e) “cuide” e “impulsione”.

 

- Leia a charge a seguir para responder às questões 7 e 8.

 


QUESTÃO 07

Com base nas informações contidas na charge, é correto afirmar que

a) o humor presente na charge decorre do fato de que a televisão não livra o filho da violência.

b) o humor presente na charge decorre do fato de o filho não estar exposto à violência.

c) o fato de o menino estar em casa significa distanciamento total de qualquer forma de violência.

d) a presença da televisão atenua os possíveis danos relacionados à violência no cotidiano.

e) a presença da mãe é uma forma de assegurar que o filho jamais terá contato com a violência.

 

QUESTÃO 08

Do ponto de vista gramatical, o verbo “assistir” foi utilizado seguindo o registro

a) formal, como intransitivo.

b) informal, como intransitivo.

c) formal, como transitivo direto.

d) informal, como transitivo direto.

e) informal, como transitivo indireto.

 

QUESTÃO 09

No livro “1984”, de George Orwell, é retratado um futuro distópico em que um Estado totalitário controla e manipula toda forma de registro histórico e contemporâneo, a fim de moldar a opinião pública a favor dos governantes. Nesse sentido, a narrativa foca na trajetória de Winston, um funcionário do contraditório Ministério da Verdade que diariamente analisa e altera notícias e conteúdos midiáticos para favorecer a imagem do Partido e formar a população através de tal ótica. Fora da ficção, é fato que a realidade apresentada por Orwell pode ser relacionada ao mundo cibernético do século XXI: gradativamente, os algoritmos e sistemas de inteligência artificial corroboram para a restrição de informações disponíveis e para a influência comportamental do público, preso em uma grande bolha sociocultural. [...]

Disponível em: https://g1.globo.com/educacao/noticia/2019/03/19/enem-2018-leia-redacoes-nota-mil.ghtml.

 

A partir da flexão do adjetivo, em destaque, pode-se entender que

a) quando o termo caracteriza substantivos com gêneros diferentes, o adjetivo deve ser flexionado no masculino e no plural.

b) há informalidade, uma vez que o adjetivo deveria concordar com o substantivo “notícias”.

c) o adjetivo caracteriza um sujeito oculto na oração, por isso é flexionado no masculino.

d) não se trata de um adjetivo de fato, já que o termo tem como origem a palavra mídia.

e) o correto seria mencionar tanto a expressão “midiáticas” quanto “midiáticos” para caracterizar “notícias” e “conteúdos”, respectivamente.

 

QUESTÃO 10

Durante a pandemia de COVID-19, muitos países adotaram medidas de lockdown, ou seja, seus cidadãos não poderiam sair de casa, a não ser em casos específicos, e o comércio deveria manter-se fechado. Algumas empresas adotaram o trabalho remoto e diversas pessoas recorreram à internet como um meio de manter contato com familiares e amigos. Sabendo que a internet foi fundamental para manutenção de vínculos sociais, analise o cartoon abaixo e escolha a alternativa correta:

  


Fonte: https://www.newyorker.com/cartoons/daily-cartoon/monday-june-28th-pandemic-proposal.

a) O cartoon retrata uma adaptação do ambiente de trabalho durante a pandemia de COVID-19.

b) O cartoon retrata as interações sociais durante a pandemia de COVID-19.

c) O cartoon retrata a produção de programas de TV durante a pandemia de COVID-19.

d) O cartoon retrata as atividades comerciais durante a pandemia de COVID-19.

e) O cartoon retrata a produção de longas-metragens durante a pandemia de COVID-19.

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