30 janeiro 2022

NEOLOGISMO II

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RESENHA - BACURAU

 


Resenha: Bacurau - Se for, vá na paz

  

Por Roger Vilela

 

“Bacurau” [...] chamou a atenção do mundo e do Brasil ao vencer o Prêmio do Júri do Festival de Cannes. Foi a segunda vez que uma produção brasileira foi premiada na competição principal do festival. [...]

O filme é um western moderno, ambientado no sertão nordestino em um futuro distópico e não muito distante. O personagem principal não é nenhum homem ou mulher, mas sim um pequeno povoado, de praticamente uma rua e de poucas casas, que dá nome ao longa. O povo que lá vive é resistente, mesmo sofrendo com a falta de água e pelo abandono das autoridades. Uma realidade vivida por muitos vilarejos e pequenas cidades Brasil afora.

Conhecemos a pacata Bacurau quando seu povo se despede de Dona Carmelita (Lia de Itamaracá), mãe do professor Plínio (Wilson Rabelo) e avó de Teresa (Bárbara Colen), que volta ao povoado devido ao falecimento da matriarca da família. Após o enterro, coisas estranhas começam a acontecer no pequeno arraial. Forasteiros aparecem, pessoas são assassinadas, o povoado não é mais encontrado nos mapas, a comunicação é interrompida, o caminhão-pipa – única fonte de água – retorna crivado de balas.

Estão sendo atacados? Quem estaria por trás de tudo isso? Os forasteiros? O prefeito e seus capangas? Com o desenrolar da trama vamos descobrindo o que realmente está acontecendo. No fim, também entendemos o porquê da frase escrita na placa que indica o caminho para o povoado: “Se for, vá na paz”. [...]

“Bacurau” é repleto de críticas sociais. Tony Júnior, o prefeito que busca a reeleição, representa a classe política desonesta, que só demonstra algum tipo de preocupação com o povo na época de eleição e que é capaz de aceitar qualquer acordo que a beneficie. Em alguns momentos sutis, como uma breve imagem na TV, o longa denuncia o caminho que o país possa estar seguindo, com o crescente autoritarismo do governo. [...]

“Bacurau” não é maniqueísta. Os personagens não são simplesmente bons ou ruins, assim como todo ser humano. No vilarejo, não há paladinos, mas sim pessoas dispostas a fazer de tudo para proteger o seu povo e sobreviver. Até entre os invasores, liderados Michael (Udo Kier), alguns apresentam um cínico limite moral, mas que não os impede de continuar a “missão”. E quando eles continuam, descobrem que as pessoas de Bacurau não são “animais mansos prontos para o abate” como foi prometido. Eles deveriam ter visitado o museu local antes de tudo, assim, teriam evitado cutucar a onça com vara curta. E quando as coisas ganham um desfecho, é impossível não vibrar.

Uma das coisas marcantes no longa, além da ação e dos personagens, é a trilha sonora. [...]

 “Bacurau” é um filme intenso, violento, com identidade própria, com personagens únicos e que não tem receio de ser político. A compreensão dele e de suas mensagens dependerá da realidade de quem o assiste. Se for assisti-lo, vá na paz!

Adaptado de: https://wp.ufpel.edu.br/empauta/resenha-bacurau-se-for-va-na-paz/

TRAILER OFICIAL

 

A distopia é um pensamento filosófico que caracteriza uma sociedade imaginária controlada pelo Estado ou por outros meios extremos de opressão, criando condições de vida insuportáveis aos indivíduos. Normalmente tem como base a realidade da sociedade atual idealizada em condições extremas no futuro.

24 janeiro 2022

AVALIAÇÃO DIAGNÓSTICA - 7º ANO

 

1. Qual é a sua interpretação sobre essa imagem.

 


 

2. Leia o texto:

 

CIRCUITO FECHADO

Ricardo Ramos

Chinelos, vaso, descarga. Pia, sabonete. Água. Escova, creme dental, água, espuma, creme de barbear, pincel, espuma, gilete, água, cortina, sabonete, água fria, água quente, toalha. Creme para cabelo, pente. Cueca, camisa, abotoaduras, calça, meias, sapatos, telefone, agenda, copo com lápis, caneta, blocos de notas, espátula, pastas, caixa de entrada, de saída, vaso com plantas, quadros, papéis, cigarro, fósforo. Bandeja, xícara pequena. Cigarro e fósforo. Papéis, telefone, relatórios, cartas, notas, vales, cheques, memorandos, bilhetes, telefone, papéis. Relógio. Mesa, cavalete, cinzeiros, cadeiras, esboços de anúncios, fotos, cigarro, fósforo, bloco de papel, caneta, projetos de filmes, xícara, cartaz, lápis, cigarro, fósforo, quadro-negro, giz, papel. Mictório, pia, água. Táxi. Mesa, toalha, cadeiras, copos, pratos, talheres, garrafa, guardanapo. Xícara. Maço de cigarros, caixa de fósforos. Escova de dentes, pasta, água. Mesa e poltrona, papéis, telefone, revista, copo de papel, cigarro, fósforo, telefone interno, gravata, paletó. Carteira, níqueis, documentos, caneta, chaves, lenço, relógio, maço de cigarros, caixa de fósforos. Jornal. Mesa, cadeiras, xícara e pires, prato, bule, talheres, guardanapos. Quadros. Pasta, carro. Cigarro, fósforo. Mesa e poltrona, cadeira, cinzeiro, papéis, externo, papéis, prova de anúncio, caneta e papel, relógio, papel, pasta, cigarro, fósforo, papel e caneta, telefone, caneta e papel, telefone, papéis, folheto, xícara, jornal, cigarro, fósforo, papel e caneta. Carro. Maço de cigarros, caixa de fósforos. Paletó, gravata. Poltrona, copo, revista. Quadros. Mesa, cadeiras, pratos, talheres, copos, guardanapos. Xícaras, cigarro e fósforo. Poltrona, livro. Cigarro e fósforo. Televisor, poltrona. Cigarro e fósforo. Abotoaduras, camisa, sapatos, meias, calça, cueca, pijama, espuma, água. Chinelos. Coberta, cama, travesseiro.

 

3. Responda:

a) Qual é o nome da classe de palavras mais presente neste texto.

b) Qual é a ideia geral que o texto apresenta.

 

Releia o trecho:

Chinelos, vaso, descarga. Pia, sabonete. Água. Escova, creme dental, água, espuma, creme de barbear, pincel, espuma, gilete, água, cortina, sabonete, água fria, água quente, toalha.

 

c) Reescreva adicionando pelo menos 4 adjetivos.

d) Reescreva adicionando palavras como se fosse contar uma narração.

 

4. Realize o exercício do link a seguir:

https://cadernospedagogicos.blogspot.com/2021/12/reuna-as-frases-em-umso-periodo.html

17 janeiro 2022

PORTUGUÊS É DIFÍCIL?





Diariamente – Marisa Monte

 

Para calar a boca: rícino/ Pra lavar a roupa: omo/ Para viagem longa: jato/ Para difíceis contas: calculadora Para o pneu na lona: jacaré/ Para a pantalona: nesga/ Para pular a onda: litoral/ Para lápis ter ponta: apontador

Para o Pará e o Amazonas: látex/ Para parar na Pamplona: Assis/ Para trazer à tona: homem-rã/ Para a melhor azeitona: Ibéria

Para o presente da noiva: marzipã/ Para Adidas: o Conga nacional/ Para o outono, a folha: exclusão/ Para embaixo da sombra: guarda-sol

Para todas as coisas: dicionário/ Para que fiquem prontas: paciência/ Para dormir a fronha: madrigal Para brincar na gangorra: dois

Para fazer uma touca: bobs/ Para beber uma coca: drops/ Para ferver uma sopa: graus/ Para a luz lá na roça: duzentos e vinte volts

Para vigias em ronda: café/ Para limpar a lousa: apagador/ Para o beijo da moça: paladar/ Para uma voz muito rouca: hortelã

Para a cor roxa: ataúde/ Para a galocha: Verlon/ Para ser "moda": melancia/ Para abrir a rosa: temporada Para aumentar a vitrola: sábado/ Para a cama de mola: hóspede/ Para trancar bem a porta: cadeado/ Para que serve a calota: Volkswagen

Para quem não acorda: balde/ Para a letra torta: pauta/ Para parecer mais nova: Avon/ Para os dias de prova: amnésia

Para estourar pipoca: barulho/ Para quem se afoga: isopor/ Para levar na escola: condução Para os dias de folga: namorado

Para o automóvel que capota: guincho/ Para fechar uma aposta: paraninfo/ Para quem se comporta: brinde/ Para a mulher que aborta: repouso Para saber a resposta: vide-o-verso/ Para escolher a compota: Jundiaí/ Para a menina que engorda: hipofagin/ Para a comida das orcas: krill

Para o telefone que toca/ Para a água lá na poça/ Para a mesa que vai ser posta/ Para você, o que você gosta: Diariamente.


09 janeiro 2022

NARRAÇÃO

 O fato

      O fato narrado, seja real ou imaginário, é elemento essencial da narração: se não há um acontecimento, não há narração. Ao narrar os fatos, empregamos muitos verbos que indicam ações. Veja:

Luciana acordou cedo e, enquanto tomava o café da manhã, leu o jornal. Depois disso, chamou um táxi e dirigiu-se ao aeroporto, onde tomou um avião para o Rio de Janeiro.

            Observe que, normalmente, os fatos narrados aparecem em ordem cronológica (geralmente do passado para o presente). Primeiro ela acordou, leu o jornal e tomou café; depois tomou um táxi, em seguida dirigiu-se ao aeroporto e, finalmente, tomou o avião.

 

Os personagens

                       Os fatos narrados sempre se referem aos personagens, que são os seres que praticam ou recebem as ações narradas. Numa narração, o número de personagens é variável: tanto pode haver um único personagem como vários. Quando há muitos personagens, os mais importantes são chamados de personagens principais e os restantes de personagens secundários.

 

O narrador

             O narrador é quem conta os fatos. Há histórias em que o narrador também é um personagem (narrador em primeira pessoa). E há histórias em que ele não participa: é apenas um observador dos fatos (narrador em terceira pessoa).

            É importante você distinguir o narrador do autor. O autor é a pessoa que escreveu a história; portanto ele pertence ao mundo real. Já o narrador é, geralmente, uma criação do autor e pertence, portanto, ao mundo da ficção. O narrador é o dono da voz, é o falante, é quem “conversa” com o leitor.

            Você poderá ler uma história de um autor que já morreu há muitos anos, mas no momento em que está lendo a história, o narrador está bem vivo lhe contando os fatos.

 

O cenário

             O cenário, ou espaço, é o local onde se desenrolam os fatos narrados. Pode ser um ambiente pequeno e bem definido (a sala de uma casa, o interior de um elevador ou de um avião) ou um lugar amplo, sem definição clara do ambiente (um continente, um país, um oceano). Você já deve ter lido histórias em que o narrador situa na Europa, por exemplo, sem definir exatamente em que lugar da Europa ele ocorreu.

            Além disso, a história pode ser ambientada num único cenário (a história inteira ocorre num único lugar) ou acontecer em vários cenários diferentes.

 

O tempo

              As ações dos personagens não acontecem todas ao mesmo tempo: elas se sucedem umas às outras.

            O tempo nas narrações pode ser definido ou vago. Certamente, você já ouviu histórias que começam mais ou menos assim: “Numa quarta-feira do mês de janeiro de 1997, Heloísa tomou um avião para o Recife. Lá chegando...” (tempo definido).

            Outras narrações podem começar assim: “Há muito tempo, na longínqua Grécia...” (tempo indefinido). As narrativas dos contos de fada costumam se desenvolver num espaço de tempo bastante vago, indefinido. Geralmente elas começam por “Era uma vez...”.

  

O conflito

             Agora, que você já sabe o que é narrador, personagem, espaço e tempo, vamos falar sobre o elemento mais importante da narração: o conflito.

            Pense nas histórias de filmes, novelas, desenhos de TV, peças de teatro. Pense nos vilões, nos “bandidos”, nos inimigos que estão sempre criando problemas para o “mocinho”. E, então, nosso herói reage enfrentando as dificuldades criadas pelos vilões. Essa disputa, essa luta que se estabelece entre as duas partes, é o que chamamos de conflito.

            Vamos tomar como exemplo a clássica história de Romeu e Julieta, do escritor inglês William Shakespeare, escrita em 1594: Romeu e Julieta são dois adolescentes que se amam, sonham em viver juntos. Mas logo se estabelece o conflito: como suas famílias são inimigas, eles não podem realizar seu sonho. O final você conhece: Julieta toma um tranqüilizante e parece morta; Romeu, acreditando ter perdido a sua amada, se suicida. Julieta acorda e, ao perceber Romeu morto, também se mata.

            A partir da história e Romeu e Julieta, podemos dizer que, na seqüência dos fatos, ao viver um conflito, os personagens têm suas vidas alteradas.

 

A narração

             Uma história é sempre o relato de um acontecimento (pode ser a ida a um show ou a um jogo, o passeio do feriado, o caso de amor entre um príncipe e uma princesa etc.). Quem relata a historia é sempre o narrador, que pode participar ou não dos fatos relatados.

            O acontecimento é vivido por personagens (você e seus amigos, um turista e uma aeromoça, um príncipe e uma princesa etc.), num determinado local (o cenário) e num determinado espaço de tempo.

            O tipo de composição que apresenta essas características é chamado de narração.

            Vamos ler, agora, um texto narrativo de Stanislaw Ponte Preta.



A estranha passageira

             - O senhor sabe? É a primeira vez que eu viajo de avião. Estou com zero hora de vôo - e riu nervosinha, coitada.

            Depois pediu que eu me sentasse ao seu lado, pois me achava muito calmo e isto iria fazer-lhe bem. Lá se ia a oportunidade de ler o romance policial que eu comprara no aeroporto, para me distrair na viagem. Suspirei e fiz o bacano respondendo que estava às suas ordens.

     Madama entrou no avião sobraçando um monte de embrulhos, que segurava desajeitadamente. Gorda como era, custou a se encaixar na poltrona e arrumar todos aqueles pacotes. Depois não sabia como amarrar o cinto e ou tive que realizar essa operação em sua farta cintura.

            Afinal estava ali pronta para viajar. Os outros passageiros estavam já se divertindo às minhas custas, a zombar do meu embaraço ante as perguntas que aquela senhora me fazia aos berros, como se estivesse em sua casa, entre pessoas íntimas. A coisa foi ficando ridícula:

            - Para que esse saquinho aí? - foi a pergunta que fez, num tom de voz que parecia que ela estava no Rio e eu em São Paulo.

            - É para a senhora usar em caso de necessidade - respondi baixinho. Tenho certeza de que ninguém ouviu minha resposta, mas todos adivinharam qual foi porque ela arregalou os olhos e exclamou:

            - Uai... as necessidades neste saquinho? No avião não tem banheiro?

           Alguns passageiros riram, outros - por fineza - fingiram ignorar o lamentável equívoco da incômoda passageira de primeira viagem. Mas ela era um azougue (embora com tantas carnes parecesse mais um açougue) e não parava de badalar. Olhava para trás, olhava para cima, mexia na poltrona e quase levou um tombo, quando puxou a alavanca e empurrou o encosto com força, caindo para trás e esparramando embrulhos para todos os lados.

        O comandante já esquentara os motores e a aeronave estava parada, esperando ordens para ganhar a pista de decolagem. Percebi que minha vizinha de banco apertava os olhos e lia qualquer coisa. Logo veio a pergunta:

            - Quem é essa tal de emergência que tem uma porta só pra ela?

            Expliquei que emergência não era ninguém, a porta é que era de emergência, isto é, em caso de necessidade, saía-se por ela.

            Madama sossegou e os outros passageiros já estavam conformados com o término do “show”. Mesmo os que mais se divertiam com ele resolveram abrir jornais, revistas ou se acomodaram para tirar uma pestana durante a viagem.

            Foi quando madama deu o último vexame. Olhou pela janela (ela pedira para ficar do lado da janela para ver a paisagem) e gritou:

            - Puxa Vida!!!

            Todos olharam para ela, inclusive eu. Madama apontou para a janela e disse:

            - Olha lá embaixo.

        Eu olhei. E ela acrescentou: - Como nós estamos voando alto, moço. Olha só... o pessoal lá embaixo até parece formiga.

            Suspirei e lasquei:

            - Minha senhora, aquilo são formigas mesmo. O avião ainda não levantou vôo.


PONTE PRETA, Stanislaw. O melhor de Stanislaw Ponte Preta. 3. ed. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1988. p. 130-131

 

Responda no seu caderno:

 

1. O narrador participa dos acontecimentos ou é um mero observador?

2. O texto fornece algumas características do narrador. Defina como é o seu comportamento.

3. Qual é o cenário dessa narrativa?

4. Caracterize a passageira.

5. As atitudes da passageira impediram o narrador de realizar o que tinha planejado. O que ele deixou de fazer?

6. Por ser gorda, a passageira enfrentou algumas dificuldades. Cite uma delas.

7. Emergência também é um personagem da história? Explique.

8. Escreva duas passagens do texto que demonstram que a mulher falava alto.




ROMANCEIRO

 

O gênero no qual Cecília Meireles se baseou para escrever o seu Romanceiro, originalmente se caracteriza como um conjunto de romances, denominados “romances tradicionais”, que são formas poético-narrativas medievais de origem ibérica. Esses romances tinham origem na tradição oral e eram musicados, e, embora fossem populares em seu tempo, atualmente restam poucos registros escritos dessas formas.

O romanceiro, desta forma, pode ser entendido como sendo um poema narrativo, de assunto histórico-épico com caráter popular. No Brasil, esse gênero chegou com seus colonizadores, reduzidas, muitas vezes, às cantigas de ninar. Muitos autores defendem seu prolongamento nos cantadores de cordel, que são caracterizados pela continuação da cultura oral e cantada, e a utilização de rimas simples, de fácil assimilação.

Cecília teria se inspirado no romance medieval de Amadis de Gaula, retomando a tradição de origem ibérica para escrever Amor em Leonoreta no ano de 1951, antes da publicação do Romanceiro da Inconfidência, em 1953.

Apesar dessa tendência ao resgate do passado na sua escolha formal, o romanceiro de Cecília não se limita aos padrões. Encontramos em sua obra moldes formais de referências diversas, desde requintes de uma poesia culta até esquemas resgatados da cultura popular.

O Romanceiro da Inconfidência apresenta caráter épico-lírico, ou seja, caracteriza-se, ao mesmo tempo, pela presença da reflexão e pelo conteúdo narrativo apoiado em fatos históricos. Ao investigarmos sua constituição, levamos em conta sua herança medieval, mas, sobretudo, os aspectos modernos no arranjo da forma e também na expressão de conteúdo. Assim, os traços líricos e épicos que se combinam e levam o leitor a transitar entre o factual histórico e o caráter universal proporcionado pelas reflexões líricas presentes na obra.

 

Adaptado de: https://periodicos.unifacef.com.br/index.php/rel/article/view/415







04 janeiro 2022

O AUTO DA BARCA DO INFERNO

 Auto da Barca do Inferno

Gil Vicente


Auto de moralidade composto por Gil Vicente por contemplação da sereníssima e muito católica rainha Lianor, nossa senhora, e representado por seu mandado ao poderoso príncipe e mui alto rei Manuel, primeiro de Portugal deste nome.

Começa a declaração e argumento da obra. Primeiramente, no presente auto, se figura que, no ponto que acabamos de espirar, chegamos subitamente a um rio, o qual per força havemos de passar em um de dous batéis que naquele porto estão, scilicet [isto é], um deles passa para o paraíso e o outro para o inferno: os quais batéis tem cada um seu arrais na proa: o do paraíso um anjo, e o do inferno um arrais infernal e um companheiro.


 * PERSONAGENS

Diabo: capitão da barca do Inferno.

Anjo: capitão da barca do Céu.

Fidalgo: tirano e representante da nobreza. Teve uma vida voltada para o luxo e vai para o inferno.

Onzeneiro: homem ganancioso, agiota e usurário. Por ter sido um grande avarento na vida ele vai para o inferno.

Joane, o parvo: personagem inocente que teve uma vida simples. Portanto, ele vai para o céu.

Sapateiro: homem trabalhador, mas que roubou e enganou seus clientes. Assim, ele vai para o inferno.

Frade: representante da Igreja, que vai para o inferno. Isso porque ele tinha uma amante, Florença, e não seguiu os princípios do catolicismo.

Brígida Vaz: alcoviteira condenada por bruxaria e prostituição que vai para o inferno.

Judeu: personagem que foi recusado pelo Diabo e pelo Anjo por não ser adepto ao Cristianismo. Por fim, ele vai para o inferno.

Corregedor e Procurador: representantes da lei. Ambos vão para o inferno, pois foram acusados de serem manipuladores e utilizarem das leis e da justiça para o bem e interesses pessoais.

Cavaleiros: grupo de quatro homens que lutaram para disseminar o cristianismo em vida e portanto, são absolvidos dos pecados que cometeram e vão para o céu.

 

TRECHOS SELECIONADOS

O primeiro interlocutor é um Fidalgo que chega com um Paje, que lhe leva um rabo mui comprido e uma cadeira de espaldas. E começa o Arrais do Inferno ante que o Fidalgo venha.

Fildalgo — Esta barca onde vai ora, que assim está apercebida?

Diabo — Vai para a ilha perdida, e há-de partir logo ess’ora.

Fildalgo — Para lá vai a senhora?

Diabo — Senhor, a vosso serviço.

Fildalgo — Parece-me isso cortiço...

Diabo — Porque a vedes lá de fora.

Fildalgo — Porém, a que terra passais?

Diabo — Para o inferno, senhor.

Fildalgo — Terra é bem sem-sabor.

Diabo — Quê?... E também cá zombais?

Fildalgo — E passageiros achais para tal habitação?

Diabo — Vejo-vos eu em feição para ir ao nosso cais...

Fildalgo — Parece-te a ti assim!...

Diabo — Em que esperas ter guarida?

Fildalgo — Que leixo na outra vida quem reze sempre por mim.

Diabo — Quem reze sempre por ti?!..[...]

Anjo — Que quereis?

Fildalgo — Que me digais, pois parti tão sem aviso, se a barca do Paraíso é esta em que navegais.

Anjo — Esta é; que demandais?

Fildalgo — Que me leixeis embarcar. Sou fidalgo de solar, é bem que me recolhais.

Anjo — Não se embarca tirania neste batel divinal.

Fildalgo — Não sei porque haveis por mal que entre a minha senhoria...

Anjo — Para vossa fantasia mui estreita é esta barca.

Fildalgo — Para senhor de tal marca nom há aqui mais cortesia? Venha a prancha e atavio! Levai-me desta ribeira!

Anjo — Não vindes vós de maneira para entrar neste navio. Essoutro vai mais vazio: a cadeira entrará e o rabo caberá e todo vosso senhorio.

Vêm Quatro Cavaleiros cantando, os quais trazem cada um a Cruz de Cristo, pelo qual Senhor e acrescentamento de Sua santa fé católica morreram em poder dos mouros. Absoltos a culpa e pena per privilégio que os que assim morrem têm dos mistérios da Paixão d’Aquele por Quem padecem, outorgados por todos os Presidentes Sumos Pontífices da Madre Santa Igreja. [...]E passando per diante da proa do batel dos danados assim cantando, com suas espadas e escudos, disse o Arrais da perdição desta maneira:

Diabo — Cavaleiros, vós passais e nom perguntais onde is?

1º CAVALEIRO — Vós, Satanás, presumis? Atentai com quem falais!

2º CAVALEIRO — Vós que nos demandais? Sequer conhecermos bem: morremos nas Partes d’Além, e não queirais saber mais.

Diabo — Entrai cá! Que cousa é essa? Eu nom posso entender isto!

Cavaleiros —Quem morre por Jesus Cristo não vai em tal barca como essa!

Tornaram a prosseguir, cantando, seu caminho direito à barca da Glória, e, tanto que chegam, diz o Anjo:

Anjo — Ó cavaleiros de Deus, a vós estou esperando, que morrestes pelejando por Cristo, Senhor dos Céus! Sois livres de todo mal, mártires da Santa Igreja, que quem morre em tal

peleja merece paz eternal.

E assim embarcam.

 


MATÉRIA RELACIONADA AO LIVRO "CEM ANOS DE SOLIDÃO"

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