Resenha: Bacurau - Se
for, vá na paz
Por Roger Vilela
“Bacurau” [...] chamou a atenção do mundo e
do Brasil ao vencer o Prêmio do Júri do Festival de Cannes. Foi a segunda vez
que uma produção brasileira foi premiada na competição principal do festival. [...]
O filme é um western moderno, ambientado no
sertão nordestino em um futuro distópico e não muito distante. O personagem
principal não é nenhum homem ou mulher, mas sim um pequeno povoado, de
praticamente uma rua e de poucas casas, que dá nome ao longa. O povo que lá
vive é resistente, mesmo sofrendo com a falta de água e pelo abandono das
autoridades. Uma realidade vivida por muitos vilarejos e pequenas cidades
Brasil afora.
Conhecemos a pacata Bacurau quando seu povo
se despede de Dona Carmelita (Lia de Itamaracá), mãe do professor Plínio
(Wilson Rabelo) e avó de Teresa (Bárbara Colen), que volta ao povoado devido ao
falecimento da matriarca da família. Após o enterro, coisas estranhas começam a
acontecer no pequeno arraial. Forasteiros aparecem, pessoas são assassinadas, o
povoado não é mais encontrado nos mapas, a comunicação é interrompida, o
caminhão-pipa – única fonte de água – retorna crivado de
balas.
Estão sendo atacados? Quem estaria por trás
de tudo isso? Os forasteiros? O prefeito e seus capangas? Com o desenrolar da
trama vamos descobrindo o que realmente está acontecendo. No fim, também
entendemos o porquê da frase escrita na placa que indica o caminho para o
povoado: “Se for, vá na paz”. [...]
“Bacurau” é repleto de críticas sociais. Tony
Júnior, o prefeito que busca a reeleição, representa a classe política
desonesta, que só demonstra algum tipo de preocupação com o povo na época de
eleição e que é capaz de aceitar qualquer acordo que a beneficie. Em alguns
momentos sutis, como uma breve imagem na TV, o longa denuncia o caminho que o
país possa estar seguindo, com o crescente autoritarismo do governo. [...]
“Bacurau” não é maniqueísta. Os personagens
não são simplesmente bons ou ruins, assim como todo ser humano. No vilarejo,
não há paladinos, mas sim pessoas dispostas a fazer de tudo para proteger o seu
povo e sobreviver. Até entre os invasores, liderados Michael (Udo Kier), alguns
apresentam um cínico limite moral, mas que não os impede de continuar a
“missão”. E quando eles continuam, descobrem que as pessoas de Bacurau não são
“animais mansos prontos para o abate” como foi prometido. Eles deveriam ter
visitado o museu local antes de tudo, assim, teriam evitado cutucar a onça com
vara curta. E quando as coisas ganham um desfecho, é impossível não vibrar.
Uma das coisas marcantes no longa, além da
ação e dos personagens, é a trilha sonora. [...]
“Bacurau” é um filme intenso, violento, com identidade própria, com personagens únicos e que não tem receio de ser político. A compreensão dele e de suas mensagens dependerá da realidade de quem o assiste. Se for assisti-lo, vá na paz!
Adaptado de: https://wp.ufpel.edu.br/empauta/resenha-bacurau-se-for-va-na-paz/
A distopia é
um pensamento filosófico que caracteriza uma sociedade imaginária controlada
pelo Estado ou por outros meios extremos de opressão, criando condições de vida
insuportáveis aos indivíduos. Normalmente tem como base a realidade da
sociedade atual idealizada em condições extremas no futuro.