09 janeiro 2022

NARRAÇÃO

 O fato

      O fato narrado, seja real ou imaginário, é elemento essencial da narração: se não há um acontecimento, não há narração. Ao narrar os fatos, empregamos muitos verbos que indicam ações. Veja:

Luciana acordou cedo e, enquanto tomava o café da manhã, leu o jornal. Depois disso, chamou um táxi e dirigiu-se ao aeroporto, onde tomou um avião para o Rio de Janeiro.

            Observe que, normalmente, os fatos narrados aparecem em ordem cronológica (geralmente do passado para o presente). Primeiro ela acordou, leu o jornal e tomou café; depois tomou um táxi, em seguida dirigiu-se ao aeroporto e, finalmente, tomou o avião.

 

Os personagens

                       Os fatos narrados sempre se referem aos personagens, que são os seres que praticam ou recebem as ações narradas. Numa narração, o número de personagens é variável: tanto pode haver um único personagem como vários. Quando há muitos personagens, os mais importantes são chamados de personagens principais e os restantes de personagens secundários.

 

O narrador

             O narrador é quem conta os fatos. Há histórias em que o narrador também é um personagem (narrador em primeira pessoa). E há histórias em que ele não participa: é apenas um observador dos fatos (narrador em terceira pessoa).

            É importante você distinguir o narrador do autor. O autor é a pessoa que escreveu a história; portanto ele pertence ao mundo real. Já o narrador é, geralmente, uma criação do autor e pertence, portanto, ao mundo da ficção. O narrador é o dono da voz, é o falante, é quem “conversa” com o leitor.

            Você poderá ler uma história de um autor que já morreu há muitos anos, mas no momento em que está lendo a história, o narrador está bem vivo lhe contando os fatos.

 

O cenário

             O cenário, ou espaço, é o local onde se desenrolam os fatos narrados. Pode ser um ambiente pequeno e bem definido (a sala de uma casa, o interior de um elevador ou de um avião) ou um lugar amplo, sem definição clara do ambiente (um continente, um país, um oceano). Você já deve ter lido histórias em que o narrador situa na Europa, por exemplo, sem definir exatamente em que lugar da Europa ele ocorreu.

            Além disso, a história pode ser ambientada num único cenário (a história inteira ocorre num único lugar) ou acontecer em vários cenários diferentes.

 

O tempo

              As ações dos personagens não acontecem todas ao mesmo tempo: elas se sucedem umas às outras.

            O tempo nas narrações pode ser definido ou vago. Certamente, você já ouviu histórias que começam mais ou menos assim: “Numa quarta-feira do mês de janeiro de 1997, Heloísa tomou um avião para o Recife. Lá chegando...” (tempo definido).

            Outras narrações podem começar assim: “Há muito tempo, na longínqua Grécia...” (tempo indefinido). As narrativas dos contos de fada costumam se desenvolver num espaço de tempo bastante vago, indefinido. Geralmente elas começam por “Era uma vez...”.

  

O conflito

             Agora, que você já sabe o que é narrador, personagem, espaço e tempo, vamos falar sobre o elemento mais importante da narração: o conflito.

            Pense nas histórias de filmes, novelas, desenhos de TV, peças de teatro. Pense nos vilões, nos “bandidos”, nos inimigos que estão sempre criando problemas para o “mocinho”. E, então, nosso herói reage enfrentando as dificuldades criadas pelos vilões. Essa disputa, essa luta que se estabelece entre as duas partes, é o que chamamos de conflito.

            Vamos tomar como exemplo a clássica história de Romeu e Julieta, do escritor inglês William Shakespeare, escrita em 1594: Romeu e Julieta são dois adolescentes que se amam, sonham em viver juntos. Mas logo se estabelece o conflito: como suas famílias são inimigas, eles não podem realizar seu sonho. O final você conhece: Julieta toma um tranqüilizante e parece morta; Romeu, acreditando ter perdido a sua amada, se suicida. Julieta acorda e, ao perceber Romeu morto, também se mata.

            A partir da história e Romeu e Julieta, podemos dizer que, na seqüência dos fatos, ao viver um conflito, os personagens têm suas vidas alteradas.

 

A narração

             Uma história é sempre o relato de um acontecimento (pode ser a ida a um show ou a um jogo, o passeio do feriado, o caso de amor entre um príncipe e uma princesa etc.). Quem relata a historia é sempre o narrador, que pode participar ou não dos fatos relatados.

            O acontecimento é vivido por personagens (você e seus amigos, um turista e uma aeromoça, um príncipe e uma princesa etc.), num determinado local (o cenário) e num determinado espaço de tempo.

            O tipo de composição que apresenta essas características é chamado de narração.

            Vamos ler, agora, um texto narrativo de Stanislaw Ponte Preta.



A estranha passageira

             - O senhor sabe? É a primeira vez que eu viajo de avião. Estou com zero hora de vôo - e riu nervosinha, coitada.

            Depois pediu que eu me sentasse ao seu lado, pois me achava muito calmo e isto iria fazer-lhe bem. Lá se ia a oportunidade de ler o romance policial que eu comprara no aeroporto, para me distrair na viagem. Suspirei e fiz o bacano respondendo que estava às suas ordens.

     Madama entrou no avião sobraçando um monte de embrulhos, que segurava desajeitadamente. Gorda como era, custou a se encaixar na poltrona e arrumar todos aqueles pacotes. Depois não sabia como amarrar o cinto e ou tive que realizar essa operação em sua farta cintura.

            Afinal estava ali pronta para viajar. Os outros passageiros estavam já se divertindo às minhas custas, a zombar do meu embaraço ante as perguntas que aquela senhora me fazia aos berros, como se estivesse em sua casa, entre pessoas íntimas. A coisa foi ficando ridícula:

            - Para que esse saquinho aí? - foi a pergunta que fez, num tom de voz que parecia que ela estava no Rio e eu em São Paulo.

            - É para a senhora usar em caso de necessidade - respondi baixinho. Tenho certeza de que ninguém ouviu minha resposta, mas todos adivinharam qual foi porque ela arregalou os olhos e exclamou:

            - Uai... as necessidades neste saquinho? No avião não tem banheiro?

           Alguns passageiros riram, outros - por fineza - fingiram ignorar o lamentável equívoco da incômoda passageira de primeira viagem. Mas ela era um azougue (embora com tantas carnes parecesse mais um açougue) e não parava de badalar. Olhava para trás, olhava para cima, mexia na poltrona e quase levou um tombo, quando puxou a alavanca e empurrou o encosto com força, caindo para trás e esparramando embrulhos para todos os lados.

        O comandante já esquentara os motores e a aeronave estava parada, esperando ordens para ganhar a pista de decolagem. Percebi que minha vizinha de banco apertava os olhos e lia qualquer coisa. Logo veio a pergunta:

            - Quem é essa tal de emergência que tem uma porta só pra ela?

            Expliquei que emergência não era ninguém, a porta é que era de emergência, isto é, em caso de necessidade, saía-se por ela.

            Madama sossegou e os outros passageiros já estavam conformados com o término do “show”. Mesmo os que mais se divertiam com ele resolveram abrir jornais, revistas ou se acomodaram para tirar uma pestana durante a viagem.

            Foi quando madama deu o último vexame. Olhou pela janela (ela pedira para ficar do lado da janela para ver a paisagem) e gritou:

            - Puxa Vida!!!

            Todos olharam para ela, inclusive eu. Madama apontou para a janela e disse:

            - Olha lá embaixo.

        Eu olhei. E ela acrescentou: - Como nós estamos voando alto, moço. Olha só... o pessoal lá embaixo até parece formiga.

            Suspirei e lasquei:

            - Minha senhora, aquilo são formigas mesmo. O avião ainda não levantou vôo.


PONTE PRETA, Stanislaw. O melhor de Stanislaw Ponte Preta. 3. ed. Rio de Janeiro: J. Olympio, 1988. p. 130-131

 

Responda no seu caderno:

 

1. O narrador participa dos acontecimentos ou é um mero observador?

2. O texto fornece algumas características do narrador. Defina como é o seu comportamento.

3. Qual é o cenário dessa narrativa?

4. Caracterize a passageira.

5. As atitudes da passageira impediram o narrador de realizar o que tinha planejado. O que ele deixou de fazer?

6. Por ser gorda, a passageira enfrentou algumas dificuldades. Cite uma delas.

7. Emergência também é um personagem da história? Explique.

8. Escreva duas passagens do texto que demonstram que a mulher falava alto.




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