Com a expansão de
Roma, os escritores tentaram criar uma tradição mítica que pudesse
fundamentar-se na Antiguidade e na ascendência divina. Dessa forma, os romanos
procuraram vencer seu contentamento face à superioridade cultural dos gregos
que não sucumbiu a eles. É exatamente o herói que encarna o sentimento de
rejeição à grandeza helênica. Incorporando à sua tradição o mito de Enéias,
personagem homérica de origem divina – era filho de Afrodite-Vênus, os romanos
respondiam a duas necessidades fundamentais de sua cultura: por um lado,
impunham-se como um mundo separado da Grécia, cuja grandeza provocava neles uma
hostilidade mesclada de inveja.
Enéias saiu de tróia e estabeleceu-se no Lácio.
Após sua morte, seu filho Ascânio sucedeu-o no governo de Lavínia. Em Alba
Longa (fundada por Ascânio), nasceriam Rômulo e Remo, os gêmeos fundadores de
Roma.
O poeta Virgílio (70-19 a.C.) que deu às várias
versões da lenda de Enéias a forma em que permanece até nossos dias. A Eneida,
sua obra-prima, incorpora essas diferentes tradições, apresentando Enéias como
símbolo não só do curso da história romana, mas também da carreira e da
política do próprio Augusto (63 a.C. – 14 d.C.), o primeiro imperador romano,
que se declarava descendente de Ascânio.
A ascensão
de Augusto teve lugar no clima de tensão e desordem que se seguiu ao
assassinato de César (101-44 a.C.). Com firmeza, ele pôs fim a guerras civis e
estabeleceu uma paz que durou cerca de cem anos. Seu governo caracterizou-se
pela reconstrução das instituições esfaceladas no fim da república: Augusto
reformou a administração, solidificou as conquistas romanas, embelezou a
cidade, fez construir estradas e favoreceu a arquitetura e a literatura.
Assim como outros de sua geração, Virgílio
inflamou-se de entusiasmo pela nova ordem, e pôs-se a escrever a Eneida com o
intuito de exaltar o Império e dotar sua raça de um herói nacional e de um
fundador. Enéias retrata a persistência, o sacrifício de si mesmo, a dedicação
a um objetivo mais alto – qualidades que, segundo o poeta, possibilitaram a
construção de Roma. Seu herói pertence à mesma categoria de Heitor ou Aquiles,
as grandes personagens descritas por Homero (séc. IX a.C.).
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