17 novembro 2021

HOMENS TRANSAM DA MANEIRA QUE COMEM

             Não sou de analisar um homem pelo jeito que fala, anda ou se porta entre amigos depois de duas doses de uísque. Para mim, a maneira mais acurada de saber quem é o cidadão, lá debaixo do verniz social, é observar como age durante uma refeição. É incrível como a maneira que alguém se comporta à mesa — quando está com fome e não consegue cumprir totalmente as etiquetas — é a mesma que se comporta na cama.

Passei um bom tempo achando essa minha mania bizarra e sem fundamento. Mas não é: comer e transar são, em muitos pontos, correlatos.  O alimento é diretamente ligado ao tipo de prazer/necessidade mais básica do ser humano, e a maneira que se lida com ele é a mesma que se lida com outros prazeres primais.

Os apressados, por exemplo: misturam, numa garfada só, a salada, o arroz, o feijão e o bife. Não sentem gosto de nada, só querem sentir-se saciados o quanto antes.

Nojentinhos cutucam todas as porções com se quisessem se certificar de que não encontrarão nada que empesteie seu paladar. Colocam ínfimas quantidades de comida no garfo e mastigam como se tivessem uma barata viva na boca. Ressentem-se de praticar essa atividade tão vil, não-civilizada, e assim, nivelarem-se ao resto da humanidade.

Gulosos leem cada linha do menu como se tivessem a sua frente o quinto segredo de Fátima. Tudo os atrai e, invariavelmente, pedem mais do que conseguem dar conta. Empaturram-se e largam tudo semi-comido.

Chatos, por mais que encham o saco do garçom averiguando cada ínfimo detalhe da receita, sempre reclamarão do que pediram. Sempre dirão que não é assim que se faz. SEMPRE colocarão defeito: só assim se sentem bem, importantes.

Gente inapetente faz parte do reino vegeto-sexual.

Quem gosta em drive-thru tem ejaculação precoce.

Comer em praça de alimentação sem PRECISAR é o equivalente a armar uma suruba: o que se quer é quantidade e agitação. Qualidade é o de menos.

Os melhores amantes cheiram tudo. Dão pequenas mordidas para perceber as texturas, sabores para, se for o caso, abocanhar o pedaço todo. Tomam o tempo que for necessário na escolha porque isso diminui a chance de arrependimento. São seletivos. Perguntam. Comem devagar o bastante para não queimar a boca e rápido o suficiente para não esfriar a comida. Não dão escândalo quando algo sai errado: vão até o fim, com parcimônia e discrição, e  nunca mais retornam. Quando gostam de verdade, não tem pudores em raspar o prato. Não dispensam a sobremesa e o café, porque aprenderam que pressa só leva à azia.

Restaurantes podem ser bem eróticos.



 

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